O ambiente de trabalho tem se transformado. As relações de hierarquia e a formalidade que, há poucas décadas, eram comuns nas empresas, hoje têm sido substituídas, e o foco passa a estar em relações mais fluidas.
Essa nova dinâmica das relações interpessoais não pode ser ignorada. Saber ouvir, expor ideias, atuar na resolução de conflitos e ter uma conversa honesta e franca são fatores-chave para a resolução de conflitos, além de construir e manter relações.
As pessoas precisam se sentir à vontade para se expor e falar sobre eventuais conflitos que possam gerar intercorrências na rotina — afinal, ninguém é robô! O papel do líder, então, é reconhecer isso e manejar as questões.
A resolução de conflitos na empresa significa coragem para enfrentar e sanar questões ligadas a divergências e visões estratégicas diferentes, mas também a picuinhas entre colaboradores e membros dos times, tão contra produtivas no trabalho.
Independentemente de qual seja a origem desses conflitos, é preciso livrar-se da ideia de que existem “pessoas difíceis de lidar”. Mire no fato de que o que existe são comportamentos belicosos, ideias divergentes, backgrounds incompatíveis, e não simplesmente seres humanos intratáveis.
A autora Louisa Weinstein, com vasta experiência em direito corporativo, private equity e consultora do setor público e social, em seu livro The 7 Principles of Conflict Resolution, fornece uma espécie de framework para uma resolução de conflitos eficaz.
Em suma, o caminho é este:
Em um ambiente de conflito, a linguagem utilizada na mediação atenuará ou potencializará a crise. O gestor deve se atentar às linguagens verbal e não verbal usadas para gerir a situação e se posicionar de modo a mitigar o conflito, sem simplesmente oprimir as opiniões que estão sendo expressas.
O autoritarismo aqui serve apenas para sufocar o conflito, não para resolvê-lo, e transforma o ambiente em uma panela de pressão. Para isso, a preparação é chave. Nunca comece uma mediação de conflitos no freestyle. Tente desenhar os cenários, entender as percepções de cada pessoa envolvida. Aqui, é importante ter empatia.
Cabe ao gestor analisar o que incomoda cada um dos envolvidos e quais são os objetivos deles nessa peleja. Assim, estará apto a ajudá-los a definir acordos específicos que, de fato, possam sanar a questão.
Gestor, seja um bom ouvinte. Entenda também que, ao longo do processo, você tem que deixar que cada pessoa identifique, aceite e administre as próprias emoções. Todo mundo pode sentir raiva, tristeza, frustração — faz parte. Não cabe a você julgar a emoção alheia.
Ao ouvir os dois lados, atente-se para a diferença entre estratégia e necessidade. Por exemplo, a estratégia de alguém pode ser defender arduamente o porte de armas. Graças a isso, tal pessoa pode se envolver em um conflito controverso.
No entanto, por trás dessa estratégia — de defender o porte de armas —, está a necessidade, que é o real motivador de a pessoa comprar essa briga. Por trás de uma estratégia controversa pode residir uma necessidade bem mais simples e comum, consensual, como se sentir mais seguro ou não conviver com o medo.
A estratégia daquele indivíduo, para suprir essa necessidade, é portar uma arma, mas existem diversas outras possíveis. E é aí que reside a possibilidade de encontrar um consenso.
O exemplo é extremo, mas mostra que, muitas vezes, pessoas em conflito têm a mesma necessidade — apenas estão se concentrando em estratégias diferentes. Mitigar um conflito, portanto, não se trata de eliminar a diferença, mas de focar os pontos de convergência.
Em seu livro Ideias Rebeldes, o autor Matthew Syedper passa por estudos da psicologia, antropologia e economia, para enfatizar o quão poderoso é congregar pontos de vista diversos, justamente porque eles estimulam a divergência. A consequência disso é uma amplitude de resultados muito mais potente, que gera soluções criativas na organização.
Mas qual é o limite a ser suportado? A maioria das pessoas já trabalhou, ou trabalha, com alguém que pode ser taxado como difícil, que causa problemas no ambiente de trabalho, e todos reconhecem o quanto essa pessoa causa interferências no ambiente.
Aqui, vale fazer um adendo para pensar nesta fórmula:
performance = talento – interferência.
Então, o limite do gestor em relação aos conflitos é a quantidade de interferências que eles podem causar até que comecem a prejudicar a performance.
Neste caso, se o líder se omite, acaba potencializando dois problemas: o primeiro deles é que a pessoa acha que está certa e vai cada vez mais conquistando espaço; o segundo é que quem está ao redor passa a acreditar que você, gestor, é conivente com tais comportamentos.
Se os conflitos não são mitigados, as consequências podem ser mais extremas: pessoas muito boas optam por sair da empresa, porque se deparam como uma cultura deturpada; ou, ainda pior, o funcionário-problema se torna referência para quem quer crescer na empresa, e o comportamento dele passa a ser emulado.
A organização não pode ficar refém de um funcionário-problema até que ele se encaixe, independentemente da entrega de resultados individuais, caso seus comportamentos sejam prejudiciais para a equipe.
Na impossibilidade de solucionar um conflito por causa da rigidez de um colaborador, é preciso avançar. Se ele tiver recebido feedbacks; se tiver passado por todo o processo interno de mediação e de resolução de conflitos; levado advertências, encare a possibilidade de demissão.
Existem três métodos básicos de solução de conflitos, que servem como ferramentas para a intervenção em situações mais críticas.
A primeira delas é a chamada de autotutela, mais conhecida como o uso da força (espero que esta jamais seja a sua opção!). Como o próprio nome diz, é uma iniciativa tomada por uma das partes envolvidas no conflito, e geralmente é permeada por bastante passionalidade. De novo, reforço: tire essa ideia da cabeça.
A segunda é a heterocomposição. Neste método de resolução de conflitos, a solução é imposta por um terceiro. Essa resolução impositiva não costuma ser a melhor.
Se você tem filhos e já os pegou brigando por algo, pense nisto: simplesmente dizer a eles “Não briguem mais!” resolve o problema? Momentaneamente, você pode até apartar a briga, mas na primeira oportunidade eles vão se engalfinhar de novo.
Outra forma de lidar com conflitos é a autocomposição. Ela consiste na busca pelo consenso, por meio do diálogo entre as partes. Como já disse, saber gerenciar as emoções e ter um pouco de empatia é importante, e aqui essas habilidades são fundamentais.
Considerada uma das formas de resolução de conflitos mais interessante para resolver problemas institucionais — o que inclui empresas e organizações —, a auto composição tem três maneiras de ser aplicada:
Existe um pouco de diplomacia aqui. Afinal, trabalhar a resolução de conflitos é importante desde a gestão de pessoas em uma empresa à condução de diálogos em zonas de guerra.
Adam Kahane é especialista em gestão estratégica e solução de conflitos, e atuou em uma grande multinacional petrolífera, mas também na Organização dos Estados Americanos (OEA).
Com essa vasta experiência, após atuar em áreas de conflito de grandes proporções, ele desenvolveu uma metodologia para lidar com conflitos chamada “colaboração estendida”.
Primeiro, há um exercício de alteridade. Nele, as pessoas reconhecem quem são suas antagonistas — não se colocando no lugar delas, mas entendendo as diferenças e as eventuais semelhanças entre si.
Assim, encontramos as necessidades a partir das estratégias. E a partir dessa compreensão, conforme Kahane, gradativamente o conflito pode ser substituído por conexão.
Optar pela autocomposição na mediação e na resolução de conflitos, mais do que criar conexões, significa empoderar os envolvidos e dar a eles autonomia para gerir as próprias emoções e chegar a conclusões que facilitarão suas vidas, e carreiras, no futuro.
Graças a isso, um estudo transversal na área da sociologia concluiu que a autocomposição, graças ao exercício de alteridade ao protagonismo cedido às partes envolvidas, é o método mais ético e eficaz de resolução de conflitos.
É importante considerar ainda que investir em soluções eficazes posteriormente se reflete em como esses cidadãos se relacionarão em sociedade.
Vale aqui ressaltar a importância de nos atentarmos à arrogância. Nesse sentido, eu costumo dizer que existem a arrogância externa e a arrogância interna.
A externa é aquela mais perceptível, que se reflete em postura inadequada, na soberba, assim como na forma como a pessoa trata os outros. Provavelmente, é a expressão de soberba mais irritante, mas, acredite, não é a mais perigosa.
É a arrogância interna, que é imperceptível a priori, a que mais atrapalha a própria pessoa (e aqueles ao redor) e a leva a tomar as piores decisões. Neste caso, ela para de ouvir os demais e acredita estar correta em todas as opiniões. Ela perde o poder de escuta e de avaliar o outro.
Manejar um conflito quando ao menos um dos envolvidos está tomado pela arrogância interna é ainda mais desafiador do que enfrentar lidar com quem só tem o famoso nariz empinado.
Essa ressalva serve para enfatizar que o mediador, que se vai se dedicar à resolução de conflitos, precisa atuar de maneira ética, empática, paciente. Ao optar pela autocomposição como método, as pessoas são o elemento central da crise e, por isso, também precisam ter a integridade preservada.
Tendo isso em mente, a própria Controladoria Geral da União propõe um modelo que inclui quatro fatores imprescindíveis ao processo de mediação para a resolução de conflitos.
O modelo é interessante porque é facilmente aplicável tanto a instituições públicas como à iniciativa privada.
Mais do que observar o outro, é importante refletir sobre a forma como você entra no conflito. Normalmente, quando alguém se envolve em conflitos, tem como objetivo impor um ponto de vista. Essa é a receita para tudo dar errado. Vale para os envolvidos e vale para o mediador.
Então, quando entrar para resolver um conflito, primeiro, busque entender os diferentes pontos de vista dos envolvidos. Se alguém tem o ponto de vista A, e o outro tem o ponto de vista B, o mediador deve entrar disposto a construir conexões.
Dessa forma, juntos, chegarão a um ponto de convergência. Assim, o mediador alcançará o objetivo, que é extrair o melhor de todos os envolvidos e alcançar uma solução permanente.
Mas é importante lembrar que algumas pessoas têm mais amor à própria opinião do que amor à solução. Este é um desafio importante — e que também vale para quem está no conflito e para quem o resolve.
Amor à solução, menos ego, ou menos vaidade, deve ser o mindset corrente quando as pessoas se propõem a solucionar conflitos.
Vale ressaltar que a forma como lidamos com o conflito diz mais do que a solução por si só. Simplesmente interromper a crise de maneira autoritária não significa resolver, de fato.
Mais do que atingir o objetivo, isto é, a resolução de conflito, o caminho até lá também deve ser correto, ético e permanente.
Ricardo Basaglia é CEO da Michael Page no Brasil e é autor do best-seller Lugar de Potência. Hoje é o headhunter mais acompanhando do Brasil, produzindo conteúdo sobre Carreira & Liderança nas redes sociais e podcast. https://www.instagram.com/ricbasaglia/
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