Mais do que a eficiência e a produtividade, as organizações devem ter em vista a importância de garantir os devidos direitos aos seus colaboradores, o que inclui o intervalo interjornada.
Seguir as normas legais que estabelecem este tipo de intervalo supera, inclusive, a determinação imposta pela CLT.
O respeito ao intervalo interjornada trata-se de um compromisso das empresas com o respeito aos direitos fundamentais dos colaboradores. Elas são obrigadas a oferecer uma pausa para seus funcionários com foco no descanso físico e mental.
Não se trata apenas de um requisito legal, mas de um pilar essencial na construção de organizações que respeitam e valorizam as pessoas como seus principais ativos.
Ao compreender como a adequada implementação do intervalo interjornada contribui para a saúde física e mental dos colaboradores, a empresa se resguarda de potenciais desafios legais e reforça sua reputação como empregadora responsável.
O que é intervalo interjornada?
Interjornada é o intervalo obrigatório entre duas jornadas de trabalho consecutivas. Configura um direito assegurado por lei ao trabalhador para que ele possa descansar, mas também realizar todas as outras atividades essenciais para a sua vida.
O objetivo da interjornada, portanto, é promover condições de trabalho mais seguras e saudáveis, prevenir a fadiga excessiva, garantir o bem-estar dos funcionários e contribuir para a segurança no ambiente de trabalho.
Qual é a diferença entre o interjornada e o intrajornada?
Enquanto o intervalo interjornada separa um dia de trabalho do outro com, no mínimo, 11 horas, o intervalo intrajornada é aquele que compõe o dia do trabalho, sendo parte dele.
O objetivo do intervalo intrajornada é que o funcionário possa descansar e também se alimentar adequadamente, conforme expresso na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
De acordo com o Artigo 71, a duração do intervalo intrajornada varia de 30 minutos para jornadas de trabalho de 6 horas, a até 2 horas para jornadas que superem as 6 horas de trabalho diárias, de acordo com o Ministério Público do Trabalho.
Convenções coletivas ou acordos coletivos de trabalho podem estabelecer regras específicas para os respectivos intervalos, desde que essas regras não sejam menos favoráveis do que as estipuladas pela legislação.
Ambos os tipos de intervalo não são apenas direitos do trabalhador, como são importantes para a manutenção da saúde, da eficiência e da produtividade do colaborador, cujo desempenho pode ser afetado por longas jornadas sem o devido descanso.
Como funciona o intervalo interjornada?
Os períodos de interjornada podem variar de acordo com a legislação trabalhista em vigor. No Brasil, de acordo com o Artigo 66 da CLT, “Entre 2 (duas) jornadas de trabalho haverá um período mínimo de 11 (onze) horas consecutivas para descanso”.
Ou seja, o intervalo interjornada não poderá ser menor do que 11 horas seguidas para o colaborador entre um dia de trabalho e outro.
O intervalo interjornada não pode ser confundido com o descanso semanal remunerado, outro direito assegurado por lei, que assegura a todo trabalhador um descanso semanal de 24 horas consecutivas.
Enquanto o intervalo interjornada não faz parte do cálculo salarial do trabalhador, já que ele não compõe a jornada de trabalho, o descanso semanal remunerado, como o próprio nome diz, é considerado como dia trabalhado, para fins salariais.
Por que essa pausa é importante para o trabalhador?
O período de descanso do intervalo interjornada serve, sobretudo, para assegurar a saúde das pessoas.
A ideia de trabalhar mais para produzir mais pode até parecer tentadora, mas é bastante equivocada sob o ponto de vista do engajamento e do bem-estar.
Jornadas prolongadas sem intervalos adequados podem levar à fadiga física e mental, contribuindo para um turnover e absenteísmo altos.
A exaustão resultante diminui a capacidade de concentração e de tomada de decisões, prejudicando diretamente o desempenho no trabalho. Ainda, aumenta a probabilidade de acidentes, pondo em risco a integridade física de pessoas.
Além disso, a exaustão resultante pode afetar as relações interpessoais no ambiente de trabalho. Colaboradores cansados são menos propensos a colaborar, e o clima organizacional pode sofrer devido ao aumento do estresse.
Um estudo publicado na área de saúde ocupacional associa as condições de trabalho inadequadas e jornadas extenuantes ao aumento no índice de casos de depressão, burnout e outros transtornos psíquicos e psicossomáticos.
A verdade é que, quanto mais as empresas cuidarem da saúde dos colaboradores e assegurar que eles terão condições adequadas de trabalho, e sobretudo de descanso, maiores serão os retornos em forma de resultados.
Segundo o artigo publicado no portal MIT Technology Review, empresas que respeitam e valorizam o descanso dos colaboradores, inclusive daqueles em home office, têm observado que eles apresentam um melhor desempenho em suas atividades.
Por outro lado, longas jornadas de trabalho sem intervalos adequados podem causar impactos significativos no desempenho dos colaboradores, afetando tanto o aspecto profissional quanto o bem-estar pessoal.
A reforma trabalhista alterou as regras do intervalo interjornada?
O cálculo da indenização em caso de descumprimento dos termos impostos pela CLT no que se refere ao intervalo interjornada foi modificado após a reforma trabalhista de 2017.
O Art. 71 da Lei nº 13.467 diz o seguinte sobre o tema:
“A não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento, de natureza indenizatória, apenas do período suprimido, com acréscimo de 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho”.
Ou seja, antes da reforma trabalhista, a remuneração do tempo de descanso do intervalo que fosse suprimido do colaborador teria natureza salarial e, na rescisão, esse pagamento interferia em todo o cálculo rescisório.
Agora, o cálculo considera apenas o período de descanso que, de fato, foi suprimido.
Apesar de a Lei mencionar especificamente o intervalo intrajornada, existe precedente legal de aplicação do mesmo critério para o intervalo interjornada.
Como o intervalo interjornada é calculado?
O cálculo do intervalo interjornada é o mesmo válido para o intrajornada, definido pela reforma trabalhista de 2017, já que antes disso esse cálculo não era especificado para a interjornada.
Até a reforma trabalhista, toda fração de tempo que fosse suprimida do descanso do colaborador deveria ser paga como uma hora de trabalho integral, acrescido de multas.
Hoje, deve ser indenizado somente o valor referente ao tempo de descanso suprimido, calculado proporcionalmente, com acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho.
Quem tem direito ao intervalo interjornada?
O intervalo interjornada é direito de todos os trabalhadores, independentemente da área de atuação.
O intervalo intrajornada também é um direito do trabalhador, mas é mais bem regulado pela CLT e, portanto, não tem definição específica para prestadores de serviços autônomos.
Já o intervalo interjornada deve ser praticado por todos, inclusive autônomos, trabalhadores temporários, prestadores de serviços intermitentes e terceirizados.
Como o RH pode criar controles eficientes para o registro da interjornada?
Sistemas eficientes de ponto eletrônico são parte do controle eficiente do registro da interjornada. Dessa forma, o RH poderá se certificar de que o colaborador cumpriu sua jornada de trabalho adequadamente e não se estendeu no horário.
Em caso de trabalho remoto ou de jornadas de trabalho híbrido, é importante lançar mão de ferramentas que atestem quando de fato o colaborador iniciou e encerrou o expediente.
Elas são importantes não para microgerenciar o colaborador, mas para assegurar que ele não ficará trabalhando para além do horário, seja para finalizar uma atividade que tenha ficado pendente, seja para adiantar as tarefas do dia seguinte.
Quando isso ocorre, a empresa acaba ficando sem ter registros dessas horas extras e não consegue mensurar quanto tempo, de fato, a pessoa esteve trabalhando.
Esse tipo de prática também é prejudicial para o descanso e, consequentemente, para o desempenho do trabalho. Por isso, é necessário estabelecer diretrizes claras para o registro da interjornada em situações de trabalho a distância.
Tendo em vista que quaisquer estratégias de produtividade passam pelo conhecimento do líder direto, é importante observar a equipe e entender se todos estão cumprimento corretamente seus intervalos interjornada.
Nos casos de trabalho remoto, o papel da liderança parece-me ter impacto ainda maior. Tenho percebido a dificuldade que os trabalhadores têm em finalizar sua jornada de trabalho (realizada em casa, na maioria das vezes).
O que acontece com as empresas que descumprem as regras do intervalo interjornada?
Empresas que descumprem as regras do intervalo interjornada estão sujeitas a diversas consequências legais, financeiras e operacionais, entre elas:
Multas e penalidades financeiras: as autoridades trabalhistas podem impor multas substanciais como penalidade pelo descumprimento das normas de intervalo interjornada, conforme previsto pela CLT.
Ações trabalhistas: os colaboradores afetados podem entrar com ações trabalhistas contra a empresa, buscando compensações devido à falta de intervalos de descanso adequados.
Riscos reputacionais: a reputação da empresa pode ser prejudicada, afetando sua imagem perante clientes, fornecedores, investidores e demais stakeholders, afetando inclusive a marca empregadora, a atração e a retenção de talentos.
Custos operacionais adicionais: problemas relacionados ao descumprimento das regras de intervalo interjornada podem demandar ajustes operacionais, como erros recorrentes, que não seriam cometidos caso os colaboradores tivessem o descanso devido.
Perda de produtividade e engajamento: colaboradores que não têm intervalos adequados podem enfrentar fadiga, estresse e redução da produtividade, o que pode afetar negativamente o desempenho geral da empresa e a satisfação dos funcionários.
Descumprir as regras do intervalo interjornada expõe a empresa a riscos legais significativos, incluindo litígios que consomem tempo e recursos consideráveis.
Portanto, é imperativo que as empresas implementem práticas e políticas adequadas e realizem auditorias regulares para garantir o cumprimento das normas de intervalo interjornada.
Além de cumprir com as obrigações legais, a atenção à qualidade de vida e ao bem-estar dos colaboradores contribui para um ambiente de trabalho mais saudável e sustentável.
Conclusão
O intervalo interjornada é parte crucial da garantia do respeito às normas legais e, sobretudo, ao bem-estar dos trabalhadores.
Este tipo de intervalo não é apenas uma obrigação legal, como também uma medida essencial para promover ambientes laborais saudáveis e sustentáveis.
O descumprimento da legislação em vigor pode acarretar penalidades financeiras, ações trabalhistas e danos à reputação das empresas.
Ou seja, cabe às organizações adotarem políticas criteriosas para assegurar que seus colaboradores estejam usufruindo do devido descanso. Aos líderes, cabe o acompanhamento diário de cada membro da equipe.
Para isso, podem ser aplicados sistemas de monitoramento eficientes e uma cultura organizacional voltada para o cumprimento das leis trabalhistas, mas também para a manutenção de uma marca empregadora positiva.
Dessa forma, não apenas se mitigarão os riscos legais, como também se fortalecerão a confiança dos colaboradores em relação à empresa, que farão, consequentemente, entregas melhores.
Garantir que o intervalo interjornada seja respeitado, mais do que proteger a empresa de ônus trabalhistas e penalidades legais, resulta em colaboradores mais saudáveis e eficientes, benefícios importantes para o sucesso e a integridade da organização.
Ricardo Basaglia é CEO da Michael Page no Brasil e é autor do best-seller Lugar de Potência. Hoje é o headhunter mais acompanhando do Brasil, produzindo conteúdo sobre Carreira & Liderança nas redes sociais e podcast. https://www.instagram.com/ricbasaglia/
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